03. D. ROSA, SR. JOÃO E SR. JOAQUIM, OFICINA

(Na oficina) Maria Franca: Gostaria de começar por perguntar há quanto tempo trabalham aqui na Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP)? Todos: (risos) há uma vida inteira! D. Rosa: Desde 1984? Ou 1986? Sr. Joaquim: tu em 1986, eu entrei em 1984, e o Sr. João entrou mais tarde. Maria: E conheciam-se antes? Sr. Joaquim: eu conhecia a D.Rosa muito bem... D. Rosa: (risos) Sim, somos um casal. Maria: O que faziam antes de entrar na faculdade? Sr. Joaquim: eu trabalhava em construção civil, trabalho de trolha, e depois trabalhei como jardineiro no Jardim Botânico. D.Rosa: eu ajudava o meu pai na lavoura e fazia costura, algumas pecinhas de roupa. Sr. João: eu deixei de estudar, fui para a tropa e vim para aqui, simples. Maria: Diretamente? Sr. João: Sim, basicamente. Quando voltei concorri para o trabalho. Mas não vim diretamente para a FAUP, estive na faculdade de ciências ainda alguns anos e depois vim para aqui como encarregado pessoal. Maria: Muito bem. E neste trabalho, gostam mais de fazer umas coisas do que outras? Alguma preferência na vossa rotina? Sr. João: Nós temos vários trabalhos, não temos uma rotina certa, aparecem sempre novas coisas para fazer. É um trabalho muito diverso Sr. Joaquim: fazemos tudo aqui dentro desta casa. Se não aparecermos uma semana, ao segundo dia já se sente a nossa falta. Maria: Sim, aliás, quando entrei na faculdade, lembro-me de colegas mais velhos me falarem das “formiguinhas da FAUP”... Sr. Joaquim: (risos) Essa é a primeira que estamos a ouvir, atenção! Sr. João: Joaquim, mas a menina tem razão, as formigas são muito trabalhadoras, ela fala muito bem. D. Rosa: Também já fomos chamados os “três mosqueteiros”... (risos) Maria: Os defensores do bem desta casa! Bom, outra pergunta que já me passou pela cabeça, ao montarem a exposição da anuária todos os anos, terão alguma curiosidade pelos trabalhos dos estudantes, e o que eles fazem ano após ano? Sr. João: Não... O que está feito, está feito. D. Rosa: O que costumo reparar é nas maquetes, algumas são mais bonitinhas e arranjadinhas, outras já estão muito desfeitas. Gosto das do 3º e 4º ano, são muito bonitas. Sr. Joaquim: Isso é o trabalho do professor. Maria: E a relação pessoal com os estudantes? Sr. João: Sim é boa no geral, sem problemas. Mas se de vez em quando for preciso dar uma palavra mais forte, dá-se! Sr. Joaquim: Às vezes estragam as coisas de propósito, e a gente chateia-se, se fosse na casa dele não fazia, não é? Não se pode pensar só nele, tem de pensar nos colegas que também vêm para cá. Maria: Sim, compreendo. Sr. João: Estragam aquilo que não lhes pertence... D. Rosa: Isto é de nós todos. Sr. João: E o que demoramos a fazer em muito tempo estraga-se num dia. Maria: Aqui dentro da faculdade, têm algum espaço preferido? (silêncio) Sr. João: Eu não tenho um espaço preferido... gosto de estar aqui na oficina. Sr. Joaquim: A oficina, sim. D. Rosa: os jardins da casa cor-de-rosa são muito bonitos, mas agora com as obras atormentam-me. Maria: Do tempo que aqui estão, há algum momento que recordem com mais carinho? Sr. João: Recordo-me dos churrascos de antigamente que eram excecionais. Havia união entre alunos e funcionários. D. Rosa: Mas era quando havia menos alunos, agora também já são muitos. Sr. João: Antes conversavam mais connosco. Até vinham aqui à oficina, vinham, sentavam-se e conversavam. Sr. Joaquim: Agora só conversam quando é para fazer as maquetes de construção. D. Rosa: Mas continuam a haver pessoas muito caridosas connosco, são os alunos novos que vêm e nunca nos chegam a conhecer bem. Sr. João: Não é pior, é diferente. Acho que a geração está a tornar-se muito individualista, é isso. Maria: Sentem-se recompensados pelo que fazem? Ou sentem que não é valorizado? Sr. João: Você já me está a dar um toque... Sr. Joaquim: De vez em quando um “obrigado” não custa. Sr. João: Reconhecer o trabalho dos outros às vezes demora. Devia acontecer mais vezes. É o sentido de aproximação de que falámos há pouco, o bom trato no trabalho. Mas não estamos mal! D. Rosa: Gostamos do que fazemos, senão não estávamos aqui. Maria: E quando eventualmente deixarem de trabalhar aqui, do que vão sentir mais saudades? D. Rosa: sentir saudades, umas coisas sim outras não. Como agora, sinto saudades do tempo de há 20 anos atrás. Sr. João: Os almoços entre os funcionários e a direção, no natal por exemplo, eram espetaculares. Maria: Agora menos relacionado com a faculdade, há alguma coisa que gostem de fazer fora do trabalho? Sr. João: Eu faço muita coisa, gosto de correr, fiz atletismo quando era novo. Agora gosto do ciclismo e de vez em quando dou um esticão na bicicleta. Não me dou bem parado muito tempo no mesmo sítio. D. Rosa: Gosto de mudar a roupinha e estar em minha casa (risos). Sr. Joaquim: Também gostamos de aproveitar o tempo com a nossa família, e os nossos netos.

Fotografia: Aúna Nune